Gurdjieff

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Quem é Gurdjieff?

quarta-feira, dezembro 14, 2005

Panorama do Pensamento de Ouspensky - Parte I

Um Breve Panorama de Certos Aspectos do Pensamento de Petyr Demianovich Ouspensky.
(Traduzido por Creomar Baptista)
Por Michael Presley

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Atenção: o que segue representa somente as opiniões e conclusões do autor.


INTRODUÇÃO

É minha esperança que esta pequena resenha poderá colocar, de maneira sucinta, as idéias de Petyr Ouspensky ao menos em algum tipo de contexto histórico, de acordo com o moderno pensamento filosófico. Também é minha intenção expressa cobrir as idéias de Ouspensky separadamente de quaisquer atributos referentes à popularização do legado de Gurdjieff. Isto é, naturalmente, não negando de maneira alguma o papel de Ouspensky como intérprete do “período russo” de Gurdjieff mas, recordando que, geralmente, os escritos pré-Gurdjieff foram relegados a importância secundária, em favor da exposição daqueles mais especificamente relacionados aos ensinamentos que recebeu de Gurdjieff. Ao passo que isto, em si, seria mais que um legado apropriado, não se pode negar que Ouspensky permanece como um pensador original e um sintetizador criativo cujos pensamentos têm valor em si, a despeito do conhecimento recebido como estudante de G. De fato, ao menos de um ponto de vista filosófico e literário há bases para pensar que seu pensamento original teria amadurecido em algo profundo, mesmo que o encontro com G. nunca houvesse ocorrido.

APRESENTAÇÃO

Ainda que o conjunto de trabalhos de Ouspensky esteja atualmente sendo impresso, a intenção do autor era preparar somente alguns escritos selecionados para publicação geral. Suas opiniões com relação ao texto conhecido como “Em Busca do Miraculoso: Fragmentos de um Ensinamento Desconhecido” não são muito claras [1]. E se tentamos uma interpretação estritamente única do pensamento de Ouspensky tudo se complica. Contendo material reunido durante seus estudos com G. os “Fragmentos” nunca foram uma tentativa para representar suas próprias idéias separadamente daquelas de Gurdjieff, mas um esforço em levar para audiência mais ampla e no interior de uma contextualização histórica um panorama de princípios já elaborados do já existente sistema de Gurdjieff. Similarmente, “A Psicologia da Possível Evolução do Homem” foi concebida somente como uma preliminar para alguns de seus próprios grupos privados de estudos, enquanto o “Quarto Caminho”, “Uma Gravação Adicional”, e uma “Gravação dos Encontros” não são obras autorizadas, mas somente transcrições de conversas levadas a cabo entre Ouspensky e seus estudantes. Se ele esperava que estes escritos fossem eventualmente divulgados logo após suas morte, isto permanece uma questão aberta. A peça “A Estranha Vida de Ivan Osokin” e o “Tertium Organum”: uma Chave para os Enigmas do Mundo”; assim como “Um Novo Modelo do Universo: Princípios do Método Psicológico em suas Aplicações aos Problemas da Ciência e Arte” continuam como suas obras autorizadas, portanto as únicas consideradas aqui [2].

EPISTEMOLOGIA E METAFÍSICA

Em nossos primeiros passos em direção à cognição, escreve Ouspensky, certas condições determinam tanto nossa maneira usual de pensamento quanto de entendimento. Muito do que tomamos como dado e familiar em nossas vidas cotidianas está, na realidade, longe de estar certo e quando ponderado continua excessivamente enigmático. A questão do tempo e sua relação com o espaço, problemas associados com os mistérios da vida e morte assim como vários conceitos de Deus do homem permanecem distantes e, obscurecidos por uma razão desamparada. Assim, o reconhecimento destes problemas como enigmas e a tentativa de obter soluções possíveis para eles continuam fundamentais para qualquer entendimento compreensivo do mundo.
Geralmente acreditamos no progresso das idéias, acreditamos que somos capazes de conhecer tanto a nós quanto ao mundo e, em menor grau, cremos também que qualquer coisa que permaneça desconhecida deve ser eventualmente revelada através da aplicação da lógica da descoberta científica. Mas o que podemos dizer com certeza que sabemos? Nossas duas intuições primárias do ser estão relacionadas à divisão entre o sujeito interno (pessoal) e o objeto externo. Além disso, isto é, além do conhecimento fenomenal intuitivo de nossa vida interior contrastada com o “mundo lá fora”, todo o conhecimento fenomenal deve ser descoberto e validado subseqüentemente através da razão em conjunção com uma metodologia estritamente empírica.
O conhecimento discursivo (o produto da razão) repousa na formação do conceito, contudo concepções não são preliminarmente intuições mas, ao invés disso, resultam de percepções integradas por nossa faculdade cognitiva (o processo de análise) e neste não temos nenhuma ligação direta ou nexo intuitivo entre o fundamento lógico (i.e, conceitual) do nosso empiricismo e do objeto desnudado. Derivado como é do conhecimento conceitual, o edifício intelectual da humanidade necessariamente permanece uma abstração que jaz em superfluidades inerentes à construção lingüística (a qual, antes de mais de mais nada, é o meio ou a ferramenta através da qual representamos nós mesmos os conceitos). Em um sentido real a razão e o conhecimento experimental continuam como criações estéticas.
Inferimos ser o mundo dos objetos ontologicamente independente dos caprichos da sensação pessoal mas, para Ouspensky, este ponto de vista é estritamente convencional. Ademais, Ouspensky escreveria que o conhecimento do Ser (a intuição ontológica fundamental em contraste com o conhecimento empírico ou fenomenal) deriva do grau de correspondência entre a forma noumênica (a qual não podemos inferir diretamente mas através do conhecimento empírico) ao lado das formulações conceituais correspondentes derivadas da experiência e razão. Assim, nosso objetivo, isto é, o objetivo da cognição é realmente a elucidação de um acurado (ou ao menos intimamente aproximado) conhecimento de um provável mundo independente da confluência entre nossas faculdades perceptivas e conceituais. Este é verdadeiro tema de “Um Novo Modelo do Universo”.
Ouspensky aceita a doutrina de Kant discutida na primeira Crítica e chamada de “Estética Transcendental” em que o filósofo idealista argumenta que a intuição simultânea do espaço e tempo é predicada de formas particulares a nossas sensibilidades e não atualmente existentes no sentido sensual (objetivo). A “Revolução Copérnica” de Kant dissipa uma visão “sensual” segundo a qual geralmente pensamos no tempo e espaço como objetos discretos funcionando não muito diferentemente de um receptáculo no qual nossa vida e as coisas que a afetam residem e evolvem [3]. A partir deste último e tradicional ponto de vista faz pouca diferença para o homem médio se a filosofia crítica ou, a este propósito, as premissas espaço-temporais do moderno pensamento científico são ontologicamente diferentes. Em nossas vidas o espaço sensual existe como um continuum euclidiano em três dimensões enquanto o tempo mostra-se a si mesmo como uma sensação interna não necessariamente fundamentada em qualquer relação espacial preexistente. Ainda que o espaço seja sentido tridimensionalmente, experimentamos o tempo linearmente, mas, como o espaço, ele prossegue único e o mesmo por toda a existência. De onde vem o tempo e para onde poder ir é algo que continua obscuro, e um esforço para comunicar a nós mesmos, através de uma tentativa de entender as “propriedades” de ambos (espaço e tempo), força-nos a oferecer termos vagos e indefinidos como “infinitude” o qual, porquanto tenha um significado matemático definido, continua, no entanto, tênue, quando visto sob o ponto de vista de uma propriedade física.
Considerando espaço e tempo como meras formas da percepção e não como objetos diretos da sensação, uma análise crítica de nosso entendimento convencional das relações espaço-temporais não pode derivar somente de uma análise empírica. De fato, seu predicado deve ser material psicológico. Ouspensky argumenta que necessitamos primeiramente especificar todos os parâmetros psicológicos inerentes à faculdade humana anterior à construção teórica. Ao manter esta linha de pensamento desenhada por Kant ele aceita um substrato suprasensível ou noumênico como a causa material do mundo. Segue daí contudo que nossa intuição do mundo é baseada em relações baseada no tempo e espaço, o terreno noumênico sob o qual o objeto perceptivo da experiência deriva em última hipótese, seu ser não possui nem as propriedades do espaço, nem do tempo.
Agora, no momento em que nossa forma externa de percepção pode ser dita como correspondente (ou ao menos ser descrita por) leis geométricas normais, e, da mesma forma, quando os “noumena” podem ser entendidos, falando fenomenalmente, é verdade que está está nesta base metafísica algo que se estende além de nosso mundo cotidiano da intuição objetiva e portanto responsável pelas coisas que percebemos, Ouspensky não deixa de achar razoável a hipótese de que o substrato que não podemos perceber, o “noumena” poderia ser descrito por intermédio de uma extensão metafísica (ou mais exatamente, metageométrica) das leis da geometria convencional. E assim como a ciência da geometria existe para descrever os fenômenos (“phenomena”) no espaço normal, uma nova metageometria postula propriedades de um espaço estendido e mais alto [4].
A forma material do espaço ao menos até o período recente tem estado assentada quase unicamente na geometria euclidiana. O espaço euclidiano tradicional é conceituado como uma esfera infinita tridimensional; isto é, uma linha que gira sobre seu eixo em 360 graus. No interior desta esfera qualquer conjunto convergente de coordenadas constitui um ponto do espaço. Construído como uma extensão ou expansão de um ponto geométrico em um sólido (o ponto sendo um limite do continuum e sua expansão completa, o sólido tridimensional, o outro) o espaço normal funciona como um paradigma para a ciência da metageometria. E assim como descrevemos como um “ponto” de matéria (ou a coleção de tais pontos) se torna um sólido de três dimensões, da mesma forma imaginamos as propriedades de espaços mais elevados.
Em primeiro lugar, quando estendo no espaço o ponto se torna uma linha da primeira dimensão. A extensão perpendicular desta linha “no espaço” cria a figura de uma superfície plana, i. e, a segunda dimensão. De maneira análoga, uma superfície estendida perpendicularmente se torna uma figura de três dimensões, um sólido. Longe de ser uma aventura puramente especulativa, pode ser notado que a existência atual de um ponto geométrico no espaço físico tem realidade perceptiva naquele pedaço de matéria em que nada menor pode ser observado. Na vida cotidiana observamos instâncias de cada um destes fenômenos, embora seja geralmente aceito que cada um existe, em realidade, diferentemente da forma como a percepção coloca o problema atribuindo-a a uma oposição entre a relação (i.e, posição relativa) do sujeito que está percebendo com seu objeto. Em “Um Novo Modelo” Ouspensky descreve uma estrela (o ponto) no céu noturno (uma superfície). A razão nos conta que estas aparências são inteiramente subjetivas, contingentes à nossa perspectiva única.
Assim, se consideramos a especificidades anteriormente comentadas da expansão geométrica, concluiremos que a dissimilaridade entre quaisquer dimensões “mais altas” ou “mais baixas” é, em si, uma matéria de perspectiva também, pois a diferença entre nosso entendimento abstrato das respectivas dimensões não é nada mais que a alteridade entre a visão de vários cortes de um objeto: o ponto é um corte de uma linha, a linha é corte de uma superfície, e a superfície existe como uma seção do sólido. Nossa preocupação óbvia, então, é como podemos possivelmente representar para nossas mentes a forma de um “sólido” dimensional do qual nossa realidade presente não é mais que um recorte?
Um “ponto do espaço trimensional” existe como um momento no tempo, ainda que permaneçamos despercebidos dos momentos estáticos isolados assim como não somos conhecedores de qualquer ponto singular no espaço. Em lugar disse, experenciamos os objetos (extensões) em movimento com relação a outro. O movimento é nossa consciência de um número suficiente de pontos discretos no tempo e pode ser representada geometricamente como um segmento de uma linha maior do tempo. Experimentamos segmentos na linha do tempo como duração e para cada e todo objeto tridimensional descoberto sabemos de sua existência por sua extensão ao longo da linha do tempo.
Deste modo, sob a perspectiva da metageometria, nosso senso do presente é realmente nada mais que o reconhecimento de recortes de uma existência espacial mais cheia e estendida que cobre inteiramente a linha de tempo.
Devido à limitação de nossa faculdade cognitiva somos imediatamente conscientes de nada mais uma corda curta, porém usualmente “contínua” dos momentos presentes. Consideramos os momentos passados, falando ontologicamente, fixos e imutáveis. Os eventos futuros, se é que podemos dizer que existem; de todo modo, existem somente como uma possibilidade, a “enteléquia” aristotélica. Não obstante, pode-se ao menos supor que, ao contrário do passado, o futuro possui graus distintos de variabilidade. E se o passado persiste somente como uma função da memória enquanto o futuro existe somente como uma incerteza delimitada por várias probabilidades de ocorrências, então devemos aceitas como realidade final e verdadeira simplesmente o presente. Na visão metageométrica, contudo, estas maneiras convencionais do pensamento são postas de cabeça para baixo. Entendendo nossa experiência do tempo como a experiência parcial do que é na realidade a extensão perpendicular de um objeto tridimensional no espaço mais elevado permite uma expansão radical da definição de atualidade, ou, para ser mais preciso, da forma do mundo.
No espaço metageométrico os objetos participam de uma ou mais dimensões que não estamos aptos a perceber. Correntemente, nossa experiência imediata de qualquer objeto consiste do conhecimento, no máximo, somente de uma porção do objeto em sua existência temporal. Graças às limitações de nossa sensação não podemos intuir diretamente o ser de um objeto no espaço quadridimensional, mas, em lugar disso, percebemos objetos tridimensionais limitados pelo tempo unidimensional (aqui, o tempo é o limite o qual é, em realidade, nada mais que nossa experiência parcial do espaço dimensional mais alto). O momento temporal é, metageometricamente falando, simplesmente uma seção de algum continuum maior em quatro dimensões, ao passo que a vida inteira de um objeto corresponde a um “pedaço” mais palpável desta “coisa” quadridimensional. Se pudéssemos notar os objetos quadridimensionalmente, poderíamos conhecê-los de maneira bem diferente. Em primeiro lugar, seriam estáticos e nunca mudariam, completos e imutáveis. Iríamos observar simultaneamente o nascimento de uma coisa, sua vida subseqüente assim como sua morte [5].
Deixe-nos tentar visualizar a forma metageométrica de um sólido quadrimensional usando como modelo o sistema planetário. Desta perspectiva, quando olhamos para o céu estamos atualmente observando recortes do sol e da lua. O movimento planetário (assim como qualquer movimento) continua como nossa percepção de uma sucessão de pontos discretos ao longo da grande linha de tempo. Assim, seria mais acurado descrever a trajetória de um planeta no espaço como uma banda espiral (da qual conhecemos apenas uma certa seção). Divorciado de sua existência dimensional mais ampla, o globo planetário parece-nos nada mais que uma esfera em um céu vazio. A fim de apreciarmos a magnitude de uma forma quadridimensional devemos tomar como nosso objeto de investigação um número suficiente de pontos ao longo da linha de tempo de nosso sistema solar. Mas na medida em que nossas próprias vidas individuais são totalmente triviais relativamente à existência solar não podemos esperar formular uma representação interessante ou mesmo aproximadamente acurada a menos que vejamos um horizonte de tempo mais largo do que o ocupado pela mera vida de um homem ou mesmo da humanidade. Assim, deixo-nos tomar como um “ponto no tempo” um segmento de um milhão de anos.
A fim de simplificar nosso modelo permitam-nos primeiramente presumir que a direção da soma compreende uma linha reta. O corpo quadridimensional ou a forma do sol através de um milhão de anos aparece como uma vara incandescente para um observador capaz de perceber tal coisa. Limitado e estreitamente enrolados sob a “vara espiral” doze fios concêntricos - os planetas. Após exame mais próximo detectamos pequenas arestas rodando em espiral os fios planetários. Estas são as várias luas e satélites. Podemos adicionalmente complicar nosso modelo para incluir asteróides e cometas à medida que percorrem o sol, e teríamos a necessidade de expandir significativamente este modelo crescente se quisermos colocar o sol em seu lugar apropriado, porque nossa estrela em si “espirala através do espaço” em sua própria trajetória determinada nos confins de um cosmos galático maior. Assim, ao invés de uma vara reta e rígida poderíamos observar uma mais curvada, entortada e espiralada. Por fim, neste novo modelo nosso tempo teria virado espaço.Imaginando o espaço desta forma (i.e, em quatro dimensões) coloca-se a questão, “E a vida do homem?”. Dissecando delicados fios tecidos do núcleo central e subseqüentemente suplantando as outras linhas (planetas) iríamos eventualmente encontrar do terceiro ao último fio de nossa terra. Se tivermos um instrumento de visão suficientemente poderoso poderemos ser capazes ate mesmo de discernir a idade do home. Até agora, um homem individual, ou mesmo uma civilização singular não seriam aparentes. Talvez algumas relíquias antigas seriam observadas tais como a Esfinge ou as grandes pirâmides. E quem sabe o período entre 1945 e 1965 seria de algum modo detectado como aquele em que as explosões de muitas bombas atômicas por parte dos EUA, URSS e China seriam medidas como estranhas emanações de energia nuclear. As guerras, mortes e todo o sofrimento da humanidade seriam algo menor, de fato. E o que reverenciamos em nossa ciência e arte, nada seriam. Na realidade se tal coisa fosse possível seriam menos do que nada, uma vez que devemos lembrar que estamos lidando com um fragmento quase instantâneo da vida do sol, i.e, meros um milhão de anos.

3 comentários:

Anônimo disse...

Leo,
Obrigado por coletar info sobre o PDO. Arranhando o conhecimento, consolado por Ivan na busca recorrente do que não vai para lugar nenhum, sigo aqui ligando minha energia na sua e assim iludindo a degeneração do sistema. O desejo pelo invisível que a lógica refuta, mas o instinto abraça.
do seu grato leitor,
Ivan Leão

Anônimo disse...

Desculpe mas todo o primeiro comentário com considerações aos autores não conferem com a natureza destes pensamentos. Uma das portas para a prisão é a alta consideração por si mesmo, por pessoas, e idéias. Como você pediu opinião estou deixando uma para analise e reconhecimento próprio.

Anônimo disse...

obrigado a todos. À época me permiti dispender tempo na traduçaõ deste artigo. Creio que não é todo inútil pois seu alvo, Ouspensky, está fora de qualquer questionamento.
Abraços,
Creomar