Continuação (Cap.1. "Os Homens entre Ruínas. Julius Evola)
A fim de
assegurar esta continuidade enquanto se aferra rapidamente aos princípios
subjacentes, é necessário eventualmente jogar fora tudo o que necessite ser
descartado, ao invés de enrijecer-se, entrar em pânico ou confusamente procurar
novas ideias quando a crise ocorre e os tempos mudam: isso é de fato é essência
do espírito conservador. Por esta razão, o espírito conservador e o tradicional
são a mesma e única coisa. De acordo com o seu verdadeiro e vital sentido, a
Tradição não é nem conformidade servil ao que foi, nem uma lenta perpetuação do
passado no presente. A tradição, em sua essência, é algo simultaneamente
meta-histórico e dinâmico, é uma força ordenadora global, a serviço de
princípios consagrados por uma legitimidade superior (podemos chamá-los mesmo de “princípios de cima”). Esta força age através das gerações, em continuidade
com o espírito e inspiração através das instituições, lei e ordens sociais que
podem até mesmo exibir uma marcante variedade e diversidade. Um engano análogo
que já condenei consiste na identificação ou confusão de várias formulações de
um passado mais ou menos com a tradição em si.
Metodologicamente,
na busca por pontos de referência, uma dada forma histórica deve ser
considerada exclusivamente como a exemplificação e uma aplicação mais ou menos
fiel de certos princípios. Este é um procedimento perfeitamente legítimo,
comparável ao que nas matemáticas denominamos a transformação de a diferencial
em uma integral. Neste caso não há anacronismo ou regressão; nada se tornou um
ídolo, ou se converteu em absoluto, aquilo não era ainda isso, desde que
esta é a natureza dos princípios.
De outro modo, seria como acusar de
anacronismo aqueles que defendem certas virtudes peculiares da alma meramente
porque as últimas foram inspiradas por certas pessoas no passado, nas quais
estas virtudes eram exibidas em elevado grau. Como o próprio Hegel disse:
“Trata-se de reconhecer no surgimento das coisas temporais e transitórias,
tanto a substância, que é imanente,
quanto o eterno, que é atual”.
Com isto em
mente, podemos ver as premissas derradeiras de duas atitudes opostas. O axioma
do conservador revolucionário ou mentalidade do reacionário revolucionário é o
de que os valores supremos e princípios fundacionais de qualquer instituição
normal e segura não são passíveis de mudanças e para que se tenha algo que se
adéque a estes valores, por exemplo, o verdadeiro Estado, o imperium, a auctoritas
(autoridade), hierarquia, justiça, classes funcionais e a primazia do elemento
político sobre os elementos social e econômico. No domínio destes valores não
há “história’ e pensar sobre eles em termos históricos é absurdo. Tais valores
e princípios têm tido caráter essencialmente normativo. Na ordem pública e política eles têm a mesma dignidade
como na vida privada, e é típico de valores e princípios de absoluta
moralidade, pois são princípios imperativos requerendo um reconhecimento
direto, intrínseco (é a capacidade de tal reconhecimento que difere
existencialmente uma certa categoria de seres de outras. Estes princípios não
são comprometidos pelo fato de que em várias instâncias um individuo, a exceção
da fraqueza ou devido a outras razões, foi incapaz de compreendê-los ou mesmo
implementá-los parcialmente em um ponto em sua vida e não em outro, à medida
que tal indivíduo não os abandona no seu interior, ele as compreenderá mesmo em
uma situação abjeta ou de desespero. As ideias às quais me refiro têm a mesma
natureza. Vico as chamou “as leis naturais de uma república eterna que varia no
tempo e em lugares diferentes”. Mesmo onde esses princípios são objetivados em
uma realidade histórica; eles não são totalmente condicionados por ele; mas
sempre apontam para um plano metafísico mais elevado.