HOMENS ENTRE RUÍNAS - Reflexões do Pós-guerra de um Tradicionalista Radical
Julius Evola
Tradução: CB
Cap. 1. REVOLUÇÃO - CONTRAREVOLUÇÃO - TRADIÇÃO (Parte I)
Recentemente,
várias forças têm tentado estabelecer uma defesa e resistência no
domínio sociopolítico contra formas extremas sob as quais a
desordem de nossa época se manifesta. É necessário admitir que se
tratam de esforços inúteis, mesmo a título de propósitos
meramente demonstrativos, a menos que as diversas raízes da doença
sejam atacadas. Estas raízes, à medida que a dimensão histórica é
concebida, devem ser reconhecidas na subversão introduzida na Europa
em 1789 e 1848. A doença deve ser reconhecida em todas as suas
formas e graus, assim, a principal tarefa será estabelecer se há
ainda há homens dispostos a rejeitar todas as ideologias, movimentos
políticos e partidos que, direta ou indiretamente, derivam dessas
ideias revolucionárias (isto é, tudo o que vai do liberalismo e a
democracia ao marxismo e comunismo). Como uma contrapartida positiva,
a estes homens deveria ser dada orientação e fundamentos sólidos,
consistindo de uma ampla visão da vida e uma doutrina robusta do
Estado.
Estritamente
falando, a palavra correta deveria ser “contrarrevolução”,
contudo, as origens revolucionárias são agora remotas e quase
esquecidas. A subversão há muito tomou raízes, a ponto de se
tornar óbvio e natural na maioria das instituições existentes.
Assim, para todos os propósitos práticos, a fórmula da
“contrarrevolução” faria sentido somente se as pessoas fossem
aptas a ver claramente os últimos estágios que a subversão mundial
está tentando encobrir através do comunismo revolucionário. Por
outro lado, outra palavra de ordem seria melhor, “reação”.
Adotá-la e chamar alguém de “reacionário” é um teste de
coragem. Há bastante tempo já, os movimentos de esquerda fizeram do
termo “reação” sinônimo de todos os tipos de iniquidade e
vergonha e uma oportunidade para estigmatizar todos aqueles que não
fossem úteis à sua causa, ou não vão junto à corrente (que se segundo eles é o “fluxo da história”). Enquanto é muito natural
para a Esquerda empregar esta tática, acho antinatural o senso de
angústia a que o termo frequentemente induz as pessoas, o que devo
à sua falta de coragem política, intelectual e mesmo física; esta
falta de coragem que atinge até mesmo os representantes da assim
chamada Direita ou “nacional-conservadores” que, tão logo sejam
“reacionários”, desculpam-se e tentam mostrar que não merecem
este título.
O
que se espera que a Esquerda faça? Enquanto os ativistas da esquerda
estão “agindo” e levando a cabo o processo da subversão
mundial, é possível supor que um conservador se refreie de reagir
e olhe, festeje-os e mesmo os ajude ao longo de seu caminho? Falando
historicamente é deplorável que a “reação” tenha sido
ausente, inadequada ou incompleta, carente de pessoas, meios e
doutrinas adequadas, justamente no momento em que a doença estava em
seu estado embrionário e suscetível de ser eliminada por
cauterização imediata de seus pontos de infecção. Fosse este o
caso, as nações europeias teriam sido poupadas de incontáveis
calamidades. O que é necessário, antes e mais nada, é um novo 'front' radical, com limites claros entre amigos e inimigos. Se o
“jogo” ainda não terminou, o futuro pertence àqueles que
partilham de ideias híbridas e fragmentadas predominantes em grupos
que nem mesmo pertencem à Esquerda, mas sobretudo aos que têm a
coragem de esposar o radicalismo – sobretudo, o radicalismo das
“negações absolutas” ou “afirmações majestáticas”, para
usar expressões caras a Donoso Cortes. Naturalmente, o termo
“reação” possui intrinsecamente uma conotação ligeiramente
negativa: aqueles que reagem não têm a iniciativa da ação, apenas
reagem de uma forma polêmica ou defensiva; quando confrontados com
algo que já havia sido afirmado ou feito. Deste modo, é necessário
especificar que a reação não consiste em deter os movimentos do
oponente sem ter algo positivo para se lhe opor. Essa percepção errônea poderia ser eliminada associando-se a formula da “reação”
com aquela da “revolução conservadora”, uma fórmula na qual um
elemento dinâmico é evidente. Neste contexto, “revolução” não
mais significa a derrota violenta de uma ordem legitimamente
estabelecida, mas antes uma ação que visa eliminar uma nova
desordem emergente; restabelecendo um estado de normalidade. Joseph
de Maistre observa que o que se precisa é mais que uma
“contrarevolução” em um sentido polêmico e estrito, é o
“oposto à revolução”, em outras palavras uma ação positiva
inspirada pelas origens. É curioso como os termos mudam: antes de
tudo, “revolução”, de acordo com seu significado latino
original (“revolvere”) referia-se a um momento que levava
novamente ao ponto inicial. Portanto, a “força revolucionária”
da renovação que deve ser empregada contra a situação existente
deve derivar das origens.
Contudo,
se alguém quiser abraçar a ideia do “conservadorismo” (isto é,
da “revolução conservadora”), é necessário proceder com
cautela. Considerando a interpretação imposta pela Esquerda, o
termo “conservador” é tão intimidador quando o termo
“reacionário”. Obviamente, é necessário em primeiro lugar
estabelecer exatamente de maneira tão exata quanto possível o que
deve ser “preservado”, hoje há muito pouco que o mereça,
especialmente na medida em que as estruturas sociais e instituições
políticas são consideradas. No caso da Itália, isto é verdadeiro
sem exceção, em menor grau é válido para a Inglaterra e França,
e menos ainda para as nações da Europa Central, nas quais os
vestígios das tradições superiores continuam a existir mesmo no
plano da vida cotidiana. De fato, a fórmula “revolução
conservadora” foi escolhida por intelectuais germânicos
imediatamente após a I Guerra Mundial, mesmo com as recentes
referências históricas. Na medida em que tudo o mais é
considerado, temos de levar em conta a realidade da situação que é
um alvo fácil para as polêmicas da esquerda, para as quais os
conservadores não são campeões de ideias mas defensores de uma
classe particular (os capitalistas), os quais se organizam
politicamente a fim de ser perpetuar, para seu proveito próprio, o
que alegadamente é um regime meramente de privilégios e injustiças
sociais. Assim se tornou muito fácil colocar juntos conservadores,
“reacionários”, capitalistas e burgueses, criando um alvo falso,
para ser usar um termo militar usado nos destacamentos de artilharia.
Como se não bastasse, a mesma tática foi empregada no tempo em que era
representada pelo liberalismo e pelo constitucionalismo. A eficácia
desta tática era devida ao fato de que os conservadores de ontem
(não como os contemporâneos, pois os antigos eram de um calibre
inegavelmente maior) limitam-se a defender suas posições
sócio-políticas e os interesses materiais de uma dada classe ou uma
dada casta, em lugar de se dedicarem a uma defesa franca de um
direito mais elevado, dignidade e a um legado impessoal de valores,
ideias e princípios. Isto de fato é sua fraqueza fundamental e
mais deplorável.
Hoje
nós afundamos em um nível ainda mais baixo, portanto a “ideia
conservadora” a ser defendida não deve apenas ter conexão com a
classe que substituiu a aristocracia derrubada e unicamente tem o
caráter de uma mera classe econômica (isto é, a “burguesia
capitalista”) – mas também deve ser resolutamente oposta a
isso. O que necessita ser “preservado” e defendido de uma maneira
revolucionária é a visão geral de vida e do Estado que baseada em
valores superiores e interesses, transcendendo definitivamente o
plano econômico, de modo que tudo possa ser definido em termos de
classes econômicas. Com relação a estes valores, o que se refere a
orientações concretas, instituições positivas e situações
históricas é somente uma conseqüência, não é o elemento
primário mas o secundário. Se as coisas foram colocadas desta
maneira, recusando-se a colocar os pés no campo onde a esquerda
treina sua mira em um “alvo falso”, esta polêmica poderia se
tornar totalmente inefetiva.
Outrossim,
o que é preciso não é artificial e coercitivamente perpetuar
formas particulares atadas ao passado que tenham exaurido suas
possibilidades vitais estando distantes do tempo atual. Para o conservador revolucionário autêntico, o que realmente conta não é
ser fiel às formas do passado e instituições, mas sobretudo aos
princípios pelos quais estas fórmulas e instituições foram
expressões foram particulares adequadas para cada
período específico de tempo em uma área geográfica específica. E
assim como estas expressões particulares devem ser vistas como
variáveis e efêmeras em si mesmas; uma vez que são conectadas a
circunstâncias históricas que não se repetem com freqüência, os princípios que os animam têm um valor que não é
afetado por tais contingências, pois gozam de atualidade perene.
Novas formas, correspondendo na essência a estas mais velhas, são
capazes de emergir delas como de uma semente, assim, mesmo que
eventualmente substituam estas velhas formas (em uma “maneira
revolucionária”) o que permanece é uma certa continuidade entre
os fatores históricos, sociais, econômicos e culturais cambiantes.
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