Sobre a questão do "Dharma, Murilo Nunes de Azevedo foi feliz em destacar sua funcionalidade e relação próxima com a ordem cósmica (Rta) na religião védica (em "O pensamento do extremo oriente. Pensamento.São Paulo, 1993"). Leia-se o seguinte excerto:
“O hindúísmo, baseado nos vedas, é a mais antiga religião do mundo que ainda se mantém viva. É como um vasto oceano que contém profundidades tão insodáveis que nem um gigante pode alcançar e poças onde as crianças podem brincar. Quanto mais a estudamos, mais nos sentimos iluminados pela beleza de seus conceitos. Sua idéia básica é a da Lei. Essa lei, que nos Vedas é apresentada como Rta, viria adquirir posteriormente a características de Dharma. Como afirma um texto védico: “O dharma é aquilo que mantém unidos as pessoas e o Universo”. Aplica-se desde o cosmo até a nossa vida diária – uma vida que poderá tornar-se feliz, tranqüila e benéfica para todas as criaturas. As relações humanas, que hoje tanto são estudadas, podem ser perfeitas quando baseadas na Lei Suprema do Dharma. O verdadeiro ariano é aquele que vive a vida de acordo com a Lei".
Com relação à especificidade do islamismo - e sua diferença do cristianismo, ao qual se revela superior dada a existência de regras a serem observadas, em "Introdução ao Islã" se lê
“A Sharia, ou Lei, é a dimensão exterior. Outra idéia-chave do Islã é a totalidade das prescrições, consideradas de origem divina, ao homem. Baseia-se essencialmente no Corão, mas também nos ditos (hadiths) e práticas (sunnah) do Profeta, no consenso da comunidade (ijma) e finalmente no raciocínio analógico, se necessário.
A Sharia diz como o muçulmano deve viver tanto em sua vida privada como social. É um guia para as ações e engloba toda faceta da vida humana, dando um significado religioso a todos os atos. Diz como o muçulmano deve se comportar, como fazer negócios (a usura, aliás é proibida), como portar-se à mesa etc.
O cristianismo, por não possuir uma Shariah, uma lei revelada para o domínio social – e tendo recusado a lei judaica, encarada como uma ‘letra que mata’, como diz o Evangelho, em nome do ‘espírito que vivifica’ – é visto pelos muçulmanos como uma ‘tariqah’, isto é, uma via exclusivamente contemplativa, sem a correspondente lei revelada. Quando o cristianismo sai da clandestinada e se torna uma religião das massas e do próprio Estado, contudo, viu-se obrigado a incorporar uma lei, a romana, ‘exoterizando’ uma via originalmente esotérica.
Do mesmo modo que o Sufismo, a Shariah está baseada no Corão e na Sunnah (os costumes, os ditos, a ‘prática’) do Profeta; a lei, contudo, interessa-se apenas pela vida ativa, e não pela vida contemplativa. Se o Sufismo visa ao amor e o conhecimento do divino, e à santificação ainda nesta vida, a Shariah visa à salvação póstuma da alma mediante o cumprimento de determinadas ações. A lei islâmica diz o que pode e que não pode ser feito pelo fiel para ganhar a salvação; já o sufismo enfatiza antes as práticas contemplativas, como as litanias, a khalwah (retiro espiritual) e a invocação (dhikir), como meios seguros para chegar a Deus, aqui e agora”.
Ação, devoção e conhecimento, são universalmetne tidos, como os três modos principais da vida espiritual. Na Índia recebem o nome de Karma, Bhakti e jnana. No sufismo são conhecidos como makhâfa (temor), mahabah (amor) e marifah (conhecimento) (...)".
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