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quarta-feira, janeiro 12, 2011

O Vento não é Triste nem Alegre

O vento não é triste nem alegre. Ele é simplesmente o vento. Os humanos inventaram conceitos que expressam estados de espírito aos quais elas se agarram como uma criança ao peito materno. Sua busca de autogratificação, o apego e à rejeição os conduzem a uma eterna escravidão e até mesmo quando se suicidam o fazem por não terem sido afastados de seu objeto de apego. A identificação no Ser humano é tamanha que há muitos de nós que rejeitamos qualquer esforço de conhecimento de nós mesmos e de liberação das ínúmeras leis que nos nos tornam mecânicos. Temos inclusive uma medonha aversão - que tentamos esconder de nós mesmos - da possibilidade de algum dia coisas como "mãe", "pai", "amigos", "filhos", "lar", "bens materiais" um dia não possam ter tanta importância. O que será de nós sem eles? Só nos esquecemos ao pensar assim de duas coisas importantíssimas: eles irão morrer um dia, nós também. A impermanência é a tônica deste reino em que estamos.
Quem seremos nós sem nossas famílias, sem nossos pais, sem nossos filhos? Confundimos a verdadeira espiritualidade com preces repetidas pelo nosso bem estar e de nossos entes queridos quando. Somos agarrados, deludidos, mecanizados, identificados. Estamos em pecado, não nos arrependemos. Não seguimos o conselho do Cristo e não deixamos nosso pai, mãe e irmã.
Aos nossos olhos de fariseus é escandaloso e indigno abandonar os pais. Aos olhos do verdadeiro trabalho anterior não. Trabalhar sobre si não é se tornar indiferente, é saber palmilhar uma trilha de bambu a milhares de metros de altura, manter o equilíbrio e permanecer vivo, sem cair. Por permanecer vivo quero dizer manter o verdadeiro amor ao próximo, que é permanente, não ilusório; é multilateral, não unilateral, é genuíno, não identificado.
Com a persistência necessária no treino do desapego iremos realizar em nosso íntimo a compreensão de que tudo é relacional. A vida - não a simples vida biológica, mas a "dança cósmica" - é um produto de eventos concatenados. Nossa vida é uma seqüência de eventos ensinava o Prof. Nicholls, nada mais que isso. Produtos de circunstâncias - cármicas, chamem-nas como quiserem - não são bons ou ruins, não são alegres nem tristes. No plano do universo apenas os seres humanos os tratam dessa forma.

Meditar no Ocidente - A Mente Raiz

Aqui no Ocidente nós encaramos a meditação de forma diametralmente oposta ao Oriente. Meditação nas línguas tibetana e no sânscrito é um estado de espírito apaziguado e a ação mental que é a causa principal de paz mental. A maçonaria e os rosa cruzes autênticos são guardiões desta velha tradição meditativa ocidental, que remonta às antigas escolas de mistérios. Em suas fórmulas fazem referências a um "Oceano de Tranquilidade" e à "Paz Profunda" que em alguns ensinamentos budistas são comparados ao mar aberto sem agitação que provoque ondas. Ou seja, nossa mente plenamente centrada, em equilíbrio.

Mas principalmente no século XX a penetração de técnicas e dos textos do Leste nos países da Europa e América mesclou-se ao cientificismo em voga para o qual cérebro e mente são a mesma coisa ou, então, muito parecidos. Com o passar do tempo a eficácia da "meditação" foi aceita, porém considerada apenas como uma terapia válida de relaxamento, diminuição do stress e alívio do desconforto associado ao uso intenso e prolongado do cérebro.

Porém, o cérebro não é a mente. Este um princípio basilar em todas as tradições do Oriente. O cérebro é um órgão físico que cumpre seu papel no âmbito do ser-forma. Haverá um dia, creio, que até mesmo este órgão poderá ser transplantado com facilidade de um crânio para outro. Há indícios que sequer a perda substancial de uma grande parte do cérebro sequer afeta funções vitais ou a fala, memória e capacidade de raciocinar das pessoas.

Então, o cérebro é apenas um instrumento. A mente é algo sutil, que perdura. Ela tem uma função no âmbito do ser, mas que transcende a forma: perceber e entender os objetos só isso. Penso que ao mesclar-se excessivamente com que os teosofistas chamam de "manas inferior", ao cérebro físico e suas elaborações, a mente é contaminda por uma série percepções errôneas que estabelecem falsas relações entre os fenômenos, as delusões.

Um dos principais objetivos da nossa vida é combater estas delusões. Os métodos de meditação recomendados pelos bons instrutores são ótimos caminhos para destruí-las, desde que se saiba meditar. O primeiro passo para se fazer uma correta meditação é deixar de lado o foco no cérebro físico. Muitas pessoas tentam meditar mas seu foco está no cérebro físico e o processo como um todo não surte efeito. Lembro-me que antes me esforçava para controlar os pensamentos, mas todo o meu esforço era guiado impulsivamente para a área no centro da testa, havendo dias em tinha até mesmo dores de cabeça.

Uma técnica budista que tem provado ser útil - ao menos para mim - é a da "mente raiz". Ela parte da natureza de clareza e da função da mente que é perceber e conhecer. Após as atitudes preparatórias, o meditador deve se esforçar para direcionar sua percepção para o chacra do coração, no centro do peito, criando uma imagem mental desta "mente raiz". Concentrando-se neste imagem e em sua função - que é pura clareza - o meditador afasta-se aos poucos da falsa percepção da mente física.

sábado, janeiro 01, 2011

O "Exagerado Senso do Eu" - Uma Personagem de Stanilavsky como Exercício do Trabalho

Uma das técnicas empregadas no budismo mahayana na meditação da vacuidade é a aquela em que o sujeito se apercebe de seu "exagerado senso do eu". Este "Eu", grandioso e pleno se manifesta em situações inusitadas mas é um útil - e talvez, principal - objeto de trabalho para o aspirante à iluminação.

No ramo mahayana o "Eu" não é a mente, nem o corpo. Ele também poderia ser a mente e o corpo, ou, em última hipótese, ter existência independente. Mas nenhuma dessas possibilidades demonstra a existência de um “eu” inerente. Ele é uma imputação mental que deixa de ter qualquer significado se analisado por negação do corpo e da mente e pela prática da vacuidade. Não implica em deixar de lado o “eu”. Ele pode prosseguir a representação de seu papel convencional junto à sociedade, aos familiares, aos amigos. Ele é um “Eu “ imputado que anda, come , fala e bebe por aí.

Em alguns momentos especiais há um agigantamento do “Eu”, ele se manifesta como uma explosão de “vontade”, um dos “Eus totais”, significativos que construímos. Se uma pessoa, por exemplo, toca em um forte traço de nós mesmos que ignoramos não ser tão importante mas diz respeito ao que realmente somos enquanto personalidade mutável este “Eu” associado a um plexo de traços subitamente vem à tona. Ele é agressivo, fala de modo calculado, com pausas lógicas, psicológicos e de “ar”. Entona, modula, dá cor à voz. Curva-se, move os braços, caminha, gira e aponta as mãos de modo peculiar. È como uma personagem detestável - que não gostamos, nem os outros -; em alguns casos o vilão da peça - que entra no palco.

Esta personagem parece obra do próprio Stanislavisky. É expressiva, plástica, representa uma linha contínua de desenvolvimento interior. Mas ela é repelente, não expressa o que pensamos e julgamos ser “nós mesmos”. Prestemos muita atenção nestes raros momentos de choque em que surge o “exagerado senso do Eu”, a personagem má que salta diante dos expectadores. Podemos aprender muito acerca de nós mesmos se a estudarmos conscienciosamente.